15 de janeiro de 2011

Capítulo Dois - Sentidos distraídos

            O grito ainda ecoava em meus ouvidos. Ninguém falava; o único som era a nossa respiração. Era aquele tipo se silêncio que gelava os nossos ossos, que nos fazia tremer de medo, mas que não podíamos quebrar.
            Então, nós ouvimos de novo, mais forte e com mais dor agora. E sem pensar, eu corri em direção ao som.
            Senti que me seguiam, mas não olhei para ver. Liguei meus sentidos de Caçadora, aqueles que ninguém sabia que eu tinha, que não eram normais, e tentei achar a aura de quem gritava. Nada, só a confusão de cor das pessoas que me seguiam.
            Uma coisa que eu me esqueci de falar: eu tenho habilidades que as pessoas não têm. Eu posso ver e sentir a aura das pessoas (cada uma tinha uma cor diferente), posso saber se dizem a verdade, em quem confiar, sentir os pensamentos delas (eu não escutava os pensamentos, eu meio que os enxergava), essas coisas um tanto bizarras. Claro, ninguém sabe disso além de mim. Até porque o que eu diria? Qualquer coisa como Ei, eu sou esquisita! Posso ver quem você é de verdade e até escutar os seus pensamentos às vezes? Ia soar muito estranho. Ah, o pior disso é que não funcionava com os monstros. Eles não tinham alma, então...
            Me dei conta de que quem gritava era um desses monstros já que não tinha sentido a aura dele. Ótimo! Eu estava correndo para salvar uma maldita aberração! Isso era magnífico!
            Deixando de lado a minha irritação, eu tentei achar os pensamentos. Nada também. Então ele gritou de novo, o som mais perto agora, e eu segui em direção a ele, usando os sentidos que todos os Caçadores tinham.
            Encontrei em poucos segundos. Não havia ninguém, só um garoto jogado no chão, com o corpo aberto e tremendo ainda. Ele era lindo, com o cabelo e a pele escuros, os olhos violetas fitando o céu com agonia diluída neles. Eu achei que fosse um vampiro, mas então vi os pelos escuros pelo corpo mutilado. Lobisomem; era um lobisomem.
            Ignorando o sangue, eu me abaixei ao lado dele. Pelo canto do olho vi minha mãe se abaixar ao meu lado.
            - Ei, tudo bem, vai ficar tudo bem... Quem fez isso com você? - eu perguntei olhando nos olhos dele para não olhar o seu corpo.
            - Nã-não sei. - ele gemeu.
            -  Quem era? Tente lembrar! - minha mãe falou com a voz dura.
            - Eu não sei! - ele gritou.
            Mais sangue jorrou do seu corpo e ele gemeu de dor. Eu respirei pela boca. Eu podia até ser uma Caçadora e ter que matar todos esses monstros, mas antes disso eu era humana e ele estava sofrendo tanto...
            Olhei para minha mãe com cara que dizia Você não ta ajudando e me concentrei nele.
            - Qual o seu nome? - perguntei.
            - Bruno - ele disse.
            - Bruno, então. Eu sei que dói, mas você precisa lembrar-se de quem fez isso com você. Precisamos achá-lo e matá-lo.
            Ele pensou um pouco, ofegando e derramando mais sangue ainda. Por fim, ele disse:
            - Tinha mais de dois metros, era grande e - ele gemeu alto.
            - O que, Bruno? - eu perguntei ansiosa. - Como ele era?
            Mas não tive resposta. O lobisomem suspirou e seus olhos se fecharam. Ele estava morto.
            - Não! Bruno, fica comigo! Não vá agora, por favor! - eu percebi que chorava.
            Não obtive resposta, é claro. Ele estava morto e não tinha como trazê-lo de volta igual nos filmes. O corpo dele estava aberto e com órgãos faltando! Tenho certeza que nada ajudaria nesse momento, nem mesmo minhas lágrimas sem sentido, então me obriguei a engoli-las e percebi o que eu estava fazendo.
            Deprimente! Eu chorava por um lobisomem! Isso podia ficar pior?
            Eu notei que todos estavam silenciosos demais e que minha mãe não estava mais ajoelhada ao meu lado. Olhei para trás e percebi o porquê no exato momento em que ouvi o rugido.
            Merda! Eu xingei. Estava tão distraída com o lobisomem que não notei essa coisa atrás de mim. Merda! Eu xingei outra vez quando a aberração mostrou os dentes afiados que me partiriam ao meio. É, estava pior do que antes.

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